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2021-06-19

ENTREVISTA PEDRO WONGTSCHOWSKI


Entrevista concedida pelo Dr. Pedro Wongtschowski, Diretor Presidente do Grupo Ultra a Aline Brasilio Ferreira, Engenheira de Meio Ambiente da Unidade da Oxiteno em Tremembé, por ocasião do Programa de Capacitação Profissional onde ela desenvolvia o tema Motivação. Essa bela entrevista se aplica também aos temas Gestão de Carreira e Cultura Organizacional.

Motivação e Gestão de Carreira

 

Um caso de Motivação pelo Exemplo e pelo Trabalho

Muitas das correntes de estudo sobre a motivação tem como pressuposto que para ser motivado é preciso ter um plano de vida.

Pesquisei referências dentro do Grupo Ultra, entretanto a trajetória que inicialmente mais me pareceu ter sido planejada foi a do presidente do grupo Pedro Wongtschowski. No intuito de conhecer como se deu seu plano de vida e como ele se motivou durante esse processo, realizei uma entrevista, em 18 de Novembro de 2009.

Engenheiro Químico, Mestre e Doutor em Engenharia pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Presidente e CEO da Ultrapar Participações

 

ENTREVISTA

Solicitei ao senhor Pedro Wongtschowski que me contasse como foi seu plano de vida, e a entrevista inicia-se assim:

Pedro:

A maioria das pessoas que eu conheço e que tiveram uma ascensão profissional não planejaram suas carreiras; o mesmo ocorreu comigo. As pessoas não precisam planejar todos os seus passos de carreira e definir suas ambições num longo prazo. Eu sou um pouco cético em relação a isso; as pessoas devem executar bem as missões que recebem. Caso você receba uma missão específica na fábrica de Tremembé, deve estudar o assunto, consultar algumas pessoas, ver como aquilo era feito no passado, verificar como se faz em outras empresas e propor uma solução. Depois que você se convencer e convencer as pessoas que a solução é boa você vai implantá-la com cuidado e dedicação. Isto é importante, pois uma vez desenvolvido um bom método de trabalho, todas as companhias estão em busca de pessoas que resolvam seus problemas.

Portanto, sua primeira missão pode ser simples, mas se essa missão você cumprir bem, não fazendo exclusivamente o que foi pedido, mas um pouco mais e, se você conseguir implementar a solução com competência, dedicação e tato, sabendo respeitar e envolver as pessoas, sabendo conquistar a adesão destas, não por imposição, mas por convencimento, então vão te dar um problema maior para resolver. Sua carreira vai ser no fundo, um conjunto de desafios sucessivos que vão aumentando de complexidade e de alcance. Por quê? Porque a companhia precisa de quem resolva problemas. E, por outro lado, você vai demandar tarefas cada vez mais complexas, desenvolver visão sistêmica e se aperfeiçoar. Cada vez os seus resultados serão melhores, mais consistentes; uma teia vai sendo construída em função das tarefas que você realiza. À medida que a companhia tem novos desafios, cada vez mais coisas serão designadas a você, e as pessoas ocupadas são àquelas que procuramos primeiro. A relação é de ganha-ganha, a companhia ganha, você ganha, certo?

Aline: Na fábrica costumamos perceber, quando se monta um novo grupo de trabalho que são sempre as mesmas pessoas que participam. Seria por esse mesmo motivo?

São sempre as mesmas, porque são as pessoas em que confiamos e que vão fazer o trabalho. Elas vão ajudar, dar idéias, estudar, ter criatividade, ter dúvidas, ter interesse, não vão para casa às cinco horas da tarde, mas se precisar ficam até as oito. Precisando, trabalham no sábado e domingo, não porque alguém pediu, mas porque se sentem motivadas no sentido de cumprir bem a tarefa que receberam, com satisfação pessoal, profissional, e vontade de fazer as coisas bem feitas.

Aline: No seu caso, na sua trajetória de vida profissional o que te motivou a fazer tudo o que fez?

Pedro: A minha história de vida é tão simples quanto isso, me deram uma tarefa simples, e eu fiz bem-feito. Então diziam, parece que esse menino leva jeito, então dá esse problema mais chato pra ele resolver, o menino ia lá e resolvia.

Aline: Como o senhor ingressou no grupo?

Pedro: Eu entrei no Grupo como estagiário de engenharia química. Estava no 5º ano da faculdade e, em julho, no meio do ano, eu resolvi que iria fazer um estágio na Ultrafértil (na época era parte do grupo, hoje não é mais).  Consegui um jeito de vir falar com as pessoas na Ultrafértil. Teve uma mulher que me disse assim: - Olha, nós não estamos contratando estagiários! Eu disse: - A senhora não me entendeu! Eu decidi que vou fazer um estágio aqui. Ela olhou pra mim, um pouco espantada, e me disse: - Explique por que você quer fazer o estágio aqui? Eu expliquei os meus motivos e, depois de umas duas horas de conversa, ela chamou outra pessoa para conversar comigo. Conversei com a segunda pessoa, depois com uma terceira e, no final ela disse que eu iria estagiar na Ultrafértil. Fiz o estágio. Depois de um mês, me pediram para continuar, mas eu estava na metade do quinto ano da Poli (USP) que exigia muita dedicação. Aí, essas pessoas me disseram que eu tinha entendido mal, elas queriam me contratar como funcionário. Eu disse: - Calma, deixa eu me formar, ainda tem seis meses para a graduação. No começo do próximo ano eu volto! Mas eles queriam me contratar naquele momento e eu não tinha tempo devido ao último ano de graduação. Daí eles me questionaram: - Quanto tempo você tem? Eu tinha dois períodos por semana, então fui contratado como funcionário da Ultrafértil, trabalhando em regime parcial. Fiquei dois anos na Ultrafértil, depois fui para a Oxiteno, e posteriormente para a Promon, como engenheiro de projetos. Num determinado momento estava num projeto e o coordenador do projeto saiu, não havia ninguém para substituí-lo. Eu não tinha idade, nem senioridade e experiência para tocar aquele projeto, mas fiquei com o projeto até o final. Essas coisas aconteceram, porque me davam um desafio, e eu fazia bem-feito.

Aline: Então gostar do que faz, foi o que o impulsionou?

Pedro: Sim, você tem que gostar do que faz, e fazer com determinação,  como se fosse a tarefa mais importante da sua vida! Agora se me perguntar se, naquela época, eu pensava onde queria estar dali a cinco anos, digo que  nunca pensei. As pessoas não acreditam, mas eu nunca planejei minha carreira. Não estou dizendo que é errado planejar, mas essa coisa de planejar querer ser gerente, depois diretor, depois presidente, pode ser um equívoco, porque a probabilidade de frustração é muito grande!

Como as companhias crescem? Elas crescem na base. A Oxiteno, nos últimos cinco anos, dobrou de tamanho. E o número de diretores é o mesmo! E essa é a virtude do crescimento, para a empresa crescer e ser competitiva, é preciso manter os custos fixos baixos. É como eu dizia quando estava na Oxiteno: - é preciso melhorar a relação reator sob diretor, ou seja, mais reatores para os mesmos diretores! A Oxiteno dobrou de tamanho, e a sua estrutura ficou substancialmente fixa, e isso é indispensável. Portanto, criar uma expectativa de ascensão profissional do tipo encarreiramento de cargos, eu pessoalmente acho um caminho errado. O caminho alternativo é você querer fazer coisas cada vez mais interessantes, complexas. Ter uma ambição do que fazer e não de onde estar na hierarquia da companhia. As pessoas não precisam ser gerentes, diretores para serem mais felizes. Há pessoas que têm vocação maior para liderança, e outras têm vocação menor. Ao longo do tempo isso se evidencia na forma de ser de cada um. A priori, querer ser presidente da companhia em dez anos é um equívoco. Agora, projeções de fazer mestrado, querer trabalhar numa planta mais complexa, participar do programa seis sigma, desejar ficar mais perto do negócio ou querer circular em diversas áreas é um planejamento que acho legítimo. Embora útil, deve ser feito também com flexibilidade, as pessoas têm que entender que toda carreira é a conciliação entre o desejo individual e a demanda da empresa, não é só o desejo ou necessidade individual ou da empresa.

Aline: A pessoa precisa estar preparada, caso a relação planejada por ela para com a empresa não aconteça. Como?

Pedro: A pessoa tem que estar disposta a realizar outras experiências, trabalhar em outras áreas. Existem pessoas que trabalhavam na área A e surge a necessidade de trabalhar na área B. Mesmo que elas nunca tenham pensado nisso, se tem uma demanda para área B, por que não? É um desafio diferente, aonde vai se aprender coisas novas, isso é bom para a carreira das pessoas, mudanças e experiências horizontais.

Aline: As pessoas tendem a ter medo da mudança em períodos de reestruturações, e passam a ter uma visão negativa diante da atuação em uma nova área. Como agir?

Pedro: Quanto ao plano de vida, eu acho que as pessoas têm que estar abertas para as oportunidades, ter coragem, disposição e autoconfiança. Não é preciso ter insegurança de ir para uma nova área. Se acharem que eu posso mudar de área, vou ter que estudar mais, ter a humildade de aprender coisas que eu não sei, e não tem nada de errado ou ruim com isso.

Aline:

Nesse momento o presidente do grupo cita um desafio que lhe foi colocado quando o coordenador sênior de um projeto deixou seu posto, e não tinham quem colocar na posição. Naquela ocasião, ele se via como um dos mais juniores da equipe que atuava na área de planejamento e foi designado para coordenar o projeto por alguns meses. Os subordinados eram bem mais velhos que ele, e segundo o próprio Pedro o desafio era ser aceito, sem constrangê-los. No entanto, ele tinha um papel a exercer e exerceu, acabou ficando na coordenação desse projeto por dois anos. O grande trunfo é ter se cercado de gente boa e experiente, mais experiente até do que ele mesmo, e coordená-las, mas sem mandar, sem tirar o poder e a autoridade. Essa sutileza é necessária para que, quando surgirem as oportunidades, se esteja preparado, inclusive para trabalhar com pessoas que saibam mais que você, mas que têm uma função diferente da sua. Portanto, não podemos nos intimidar, e nem perder a humildade.

De acordo com o presidente do grupo, a humildade é algo que deve ser buscada permanentemente. Também relata que sempre se preocupou caso o pessoal começasse a ficar muito arrogante. Pedro acredita que a arrogância é um defeito terrível, e vê isso como risco para qualquer empresa e que a equipe deve se pautar por aprofundamento, estudo e humildade. “Toda vez que a gente se prepara melhor, a chance de ganhar o mercado é maior”. Também a humildade, a vontade de aprender e a profundidade são fundamentais. “Acredito que alguém em posição de liderança deve reforçar essa mensagem de presença, de interesse, e exigência. Isso é o que eu tenho tentado fazer ao longo da minha vida”.

Aline: Então, as lideranças têm um papel importante para impulsionar seus liderados?

Pedro: Sim, mas todos nós, em escala maior ou menor, somos líderes. Todo engenheiro é líder. Se você tem um time que está sob sua coordenação, naquele momento você é o líder, então você deve dar o exemplo. Tem coisas que eu fazia e as pessoas não se davam conta. Eu marcava reunião nas fábricas às nove horas da manhã, porém era comum eu chegar às sete. Ia primeiro à sala de controle, via a programação da produção, as paradas previstas, conversava com os operadores. Quando as pessoas chegavam para a reunião, eu já tinha um grau de informações, que talvez eles próprios não tivessem. O simples fato de perguntar para as pessoas as deixa feliz, é um motivador para elas. O fato de você perguntar demonstra interesse, demonstra a valorização da função de cada um. São pequenos gestos que fazem toda a diferença. Além do que, se eu cheguei às sete da manhã, tive que sair da minha casa às cinco e meia da manhã. Essa é uma atitude que marca as pessoas como exemplo de dedicação. Não é porque a pessoa é importante, diretor, presidente ou diretor superintendente que vem de comitiva. Eu chego cedo, chego sozinho, círculo, pergunto. O exemplo é poderosíssimo, é o principal componente da liderança.

Nesse momento o senhor Pedro me relata sobre um discurso que fez na comemoração dos 30 Anos de Oxiteno, intitulado de: O que é ser Oxiteno. Conversei com o gerente de RH da Oxiteno para me disponibilizar uma cópia, e segundo ele, o discurso foi bastante motivador por parte do senhor Pedro Wongtschowski e estimulante para àqueles que ouviram.

 

Parte do texto apresentado por Pedro Wongtschowski em 12/12/03 por ocasião da festa comemorativa dos 30 anos da Oxiteno.

 

O que é afinal ser Oxiteno? O que é ser parte desta empresa, o que é trabalhar com este conjunto notável de pessoas; as que estão aqui hoje e nossos colegas de Camaçari e de Triunfo.

Ser Oxiteno é acordar durante a noite lembrando o problema do nosso cliente.

Ser Oxiteno é participar da equipe de implantação do Oracle e passar dias e noites preparando a empresa para uma grande transformação.

Ser Oxiteno é vibrar com a partida rápida de uma unidade nova; é emocionar-se com uma elegante e eficiente solução de engenharia.

Ser Oxiteno é passar dias longos no laboratório, na planta piloto, criando soluções inovadoras para o cliente.

Ser Oxiteno é envolver-se emocionalmente com a empresa, é tratá-la como sua, é vibrar com o sucesso de um produto ou de um processo novo.

Ser Oxiteno é ter a disciplina, o método e o cuidado no trato da segurança e do meio ambiente.

Ser Oxiteno é ser colega, é lutar junto, é entristecer-se, chorar mesmo, com os problemas inesperados.

Ser Oxiteno é ser humilde e encontrar no erro o incentivo e a motivação para a inovação, a solução, a descoberta.

Ser Oxiteno é gostar de festejar os 30 anos, pensando sempre no futuro.

Ser Oxiteno é vestir esta camisa com emoção e com orgulho.

Ser Oxiteno é confiar que o futuro será ainda melhor, porque depende só de nós. E nós saberemos construir este futuro.

 

Meus Amigos

O que faz uma empresa grande não são suas fórmulas, não são suas máquinas. O que distingue uma empresa excelente de uma empresa medíocre são as pessoas que a ela pertencem.

A entrevista com o senhor Pedro Wongtschowski finaliza com um aconselhamento feito a mim e a toda a companhia, de que é tarefa de cada um de nós se perguntar: Faço o que gosto? Estou onde gosto? Se não for, é preciso buscar outro local, outra atividade, ou então nunca se estará motivado!

c. CONCLUSÃO

O benchmarking foi uma grata surpresa em muitos sentidos, pois várias correntes sobre motivação até o momento me levavam a crer que para ser motivado seria necessário ter um plano pré-estabelecido, como num plano de carreira. Ao entrevistar o senhor Pedro Wongtschowski, estive diante de sua afirmação de que nunca havia planejado seus passos, ou estabelecido metas rígidas. No entanto, é possível constatar, nitidamente, que ele mesmo sem planejar se valeu de ferramentas indispensáveis para se manter motivado, e essa conduta foi a mola propulsora no seu desenvolvimento profissional.

Em boa parte da entrevista o senhor Pedro citou enfaticamente, que em sua trajetória sempre abraçou as tarefas a ele designadas com muito empenho, dedicação e profundidade, buscando ir além do que era proposto em seus desafios, ou seja, a cada nova situação ele se colocava como o responsável por imprimir valor naquilo que fazia, e por ir além, promovendo seu desenvolvimento. Por isso pude perceber que o senhor Pedro Wongtschowski em sua trajetória soube identificar muito bem seus fatores intrínsecos, que o impulsionaram naturalmente para a ascensão.

O aprendizado marcante dessa entrevista para mim, é que em situações de liderança devemos valorizar as pessoas, cultivar as relações, nos autoquestionarmos sobre o que gostamos ou queremos, e que é possível traçar planos sim, mas com flexibilidade para não nos conduzirmos à frustração, se fazer valer de autoconfiança para inovar, mudar sem esquecer da humildade permanente. Todos esses elementos, em equilíbrio, nos conduzirão ao futuro mostrando tudo o que seremos e não onde estaremos na hierarquia das companhias. À medida que pensamos por essa lógica, só há probabilidade de sucesso, felicidade e motivação.

Saí dessa entrevista muito motivada, porque percebi o quanto os meus valores estavam atrelados aos valores que partem da presidência da companhia, ou seja, as expectativas da organização.

Saio também, com a inquietude de alguém que enfrentará os desafios com confiança, profundidade e paixão.